segunda-feira, 29 de março de 2021

O CORTEJO SEGUE.

 O carro funerário passou pela porta da casa onde o defunto morava. Parou.

 A cirene ligada convidava a todos os vizinhos a chegarem até a porta.  De longe, com medo, todos olhavam, davam um tchau e não conseguiam conter lágrimas que escorriam sem pudor, trazidas pelas lembranças de bons momentos com o amigo e pela tristeza do adeus.

Os familiares à porta lançaram sobre o carro algumas flores. Seria aquela a única despedida possível...

O caixão  não poderia ser aberto pois  o vírus estava ali dentro misturado aos restos mortais, cumprira naquele corpo o seu destino que é a destruição, mas queria mais... É voraz, é guloso, olha com olhos desejosos a todos em volta.

Mais uma família destruída, mais lágrimas rolando ao chão, e um mar de incertezas que cobre a todos com ondas gigantescas...

Perguntas e mais perguntas...um “até quando” está espalhado pelo ar,  dentro dos carros,  das janelas fechadas das casas, no semblante preocupado por trás das máscaras, ronda por ruas e praças, e em cada segundo do viver. Quem tomará providencias de verdade?  Por que tanta incompetência e tanto desinteresse? Por que desdenhar de nós?  Quando a inércia cessará? Quem cuidara do nosso povo ?  Perguntas rondam enquanto podem.

Uma chuva de aplausos tchaus e beijos e o cortejo vai seguindo...

quinta-feira, 25 de março de 2021

GOSTO MUITO

 Ando por lugres desertos em contato com a natureza principalmente de manhã.

Gosto de ouvir os passarinhos,

gosto de ver o verde,

gosto de descobrir as cores que desabrocham sob o sol ainda não muito quente.

Gosto de andar,

gosto de me movimentar,

Sentir um sabor delicioso de liberdade ao ver um campo aberto, um lugar deserto, amplo onde eu possa explorar todas as possiblidades dos sentimentos que residem em mim, refletir sobre a vida, buscar soluções.

Com meu kindle Ler, ler , ler enquanto ando.

Andar, me sentir livre e sentir as belezas do lugar.

Gosto de ser um ser livre das amarras do barulho, da confusão...

gosto da paz da liberdade da solidão.

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quarta-feira, 10 de março de 2021

FAROL

 Eis aqui uma história que fez-me ver  o valor do conhecimento e seu poder de transformação.

Uma garotinha bem pequenina,  filha do marido da minha irmã, vinha visitar-nos  nos fins de semana.
Fui apresentado  à pequena e como era de se esperar,  minha sina eterna, a garota não conseguia pronunciar meu nome. Enrolou-se entre vários apelidos até que escolheu  “niucio”. E ganhei um nome a mais para minha coleção. Por mais que eu repetisse, a infante  não conseguia pronunciar corretamente.
Até que um belo dia quando estava sendo alfabetizada, trouxe uma pequena lousa e um pedacinho de giz. Daí eu disse. Hoje você vai aprender como é o meu nome de verdade  e nunca mais vai errar. Comecei a soletrar enquanto ela escrevia no pequeno quadro: M Ú C I O.
Ao final olhou-me mim com um brilho diferente nos olhos e com sorriso triunfante  bradou a epifânica interjeição: AH É MÚCIO!
E naquele momento eu vi a força e o poder transformador do conhecimento. O brilho que saltava daqueles olhinhos vinha de outro farol que iluminava dentro daquele pequeno ser, a estrada de uma nova era. Ali estava o poder do conhecimento e da liberdade que ele trás.   A luz certeira  da descoberta de um novo mundo e de novas possiblidades. Um lume mágico sendo lançado sobre as sombras do obscurantismo e da ignorância.
 Ela havia entendido, ela havia mudado o seu conceito. A luz se acendeu.  Já não era mais o mesmo ser.
Nunca mais errou meu nome.
 
MÚCIO ATAIDE

terça-feira, 9 de março de 2021

EM CASA

Eu sou introvertido e gosto de ficar em casa quieto e  tranquilo. Incomoda-me a futilidade do papo de certas pessoas que toma nosso tempo com conversas prolixas sem nenhum conteúdo.

Sinto por  muitas vezes a bateria descarregada e a vontade me recolher para refazer minhas forças.

Pensando sobre esse aspecto deveria eu adorar a pandemia, afinal de contas ela marca a nossa vez. É o momento em que o jeito de ser introvertido ganha espaço. O mundo agora é introvertido. As pessoas foram de certa forma obrigadas a assumir o nosso jeito de ser. Estão agora em casa, mais quietas tendo que conviver com coisas que para nós é comum. Acredito que algumas estão se descabelando porque não conseguem viver sem os agitos, as festas, as rodas de conversas e os risos por aí.

Quem sabe se assim vão aprender a nos dar mais valor. A entenderem melhor o nosso jeito de ser.

No mês de março do ano passado, meu patrão decidiu que ficaríamos parados durante um tempo. Em casa e apenas em casa.  Por volta de um mês o escritório onde trabalho não funcionou.

Então eis que alegria poder ficar em casa lendo, escrevendo, fazendo as coisas que gosto sem compromisso. Foi muito bom de início.

 Mas ali a situação era diferente. Eu estava sendo obrigado a ser introvertido. O meu modo de agir que para mim seria natural tornou-se artificial e diminuiu aquela sensação gostosa do início. Tornou-se sufocante. Acho que senti um pouco do que um extrovertido sente quando é obrigado a se recolher. Eu sou arredio ao convívio social, mas gostava de vê-lo acontecendo à minha volta. Ouvir conversas e até ver um pouco de movimento. Na pandemia estava eu privado disso. E percebi que o isolamento o tempo todo não é bom. E que o isolamento cercado de medos e inseguranças quanto ao futuro é algo sufocante.

Gostei de estar isolado em alguns momentos, mas em outros senti-me entediado e nervoso. Deu-me sensação de sufoco, de estar um pouco abandonado e nesse tempo pude confirmar a máxima do filosofo japonês Yoritomo Tashi: É na solidão que os pensamentos se transformam tornando-se irreconhecíveis.

Mas é aquela velha historia quando não se pode é que se quer. Apesar do meu jeito introvertido, me sinto as vezes um pouco sufocado pelo fechamento que a pandemia traz. Não querer sair e socializar é uma coisa, não poder fazer isso é outra diferente. Parece que estar condicionado a um determinado comportamento nos faz sentir mal. Como se estivéssemos nas grades de uma prisão.  São contradições que moram dentro de nós. Gostar de viver na solidão e nesse momento sentir-se um pouco abandonado por viver nela.

A pandemia ensina-me como são contraditórios as nossas emoções e os nossos valores. Queremos o que não temos. E não damos valor ao que temos. 

segunda-feira, 8 de março de 2021

VIVA A DEMOCRACIA.

 Viva a democracia

que seja ela a  nossa casa 

Ave bela que pouse sobre nós

abrindo suas lindas asas

que derrube todos os grilhões 

prisões, injustiças e amarras

que faça com que a verdade prevaleça

E que a mentira para o inferno desça

brindemos a ela  com festa e farra. 


 




sábado, 6 de março de 2021

ESPECTROS NA NOITE

 Pela janela olhava  a rua

E luzes lá bem distante

carros, buzinas, sons na noite

esperanças e medos rondantes

viu espectros  pelos ares 

E um  misterioso  clarão 

chuva fina que  molhava a terra

um cristo no alto da serra

tudo  se misturando à solidão.



quinta-feira, 4 de março de 2021

COMO É O NOME?

Há poucos dias fiz uma crônica com o título MEU NOME.  E pelo fato de meu nome ser um pouco diferente, tenho a certeza de que quando algumas pessoas começaram a lê-la, pensaram que era autobiográfico, E no entanto era um texto ficcional. Então agora resolvi falar sobre meu nome mesmo  e apresentar aqui algumas curiosidades sobre ele.
Na época em que eu nasci o meu pai ilustríssimo Sr.  Ataide Ferreira dos Santos tinha o costume de ler todos os dias num jornal matinal a  coluna de um  famoso  jornalista chamado Múcio Athayde. O renomado homem de imprensa tornou-se até deputado e fez algumas peripécias não muito honestas por aí, mas sobre esse assunto prefiro não entrar em detalhes para preservar o nome do nosso nome. Quem quiser que pergunte ao pai google sobre o parlamentar que tinha o apelido de: O homem do chapéu, mas enfim, quando nasci  papito resolveu colocar esse nome em mim que homenageava ao jornalista  e a ele mesmo . E assim passei a assinar a alcunha de Múcio Ataide Ferreira. Um nome raro, outro nome raro e um sobrenome comum. Nome, pré-nome, antenome nem sei qual é qual.   Esse sou eu.
Um dia tive a ideia de pesquisar no google sobre o significado do meu nome pensando que  seria algo bonito, nobre, mas a mãe etimologia premiou-me apenas com um seco e discreto MUDO. É esse o significado do meu nome. Eu sou o MUDO. Talvez por isso seja calado. Quando me tornei cônscio do significado, nada disse, fiquei múcio.
E quando um dia uma pessoa elogiou-o dizendo tratar-se de um nome bonito, forte, raro e marcante, eu confesso que fiquei eMUCIOnado.
Acho que existem poucos múcios no mundo, mas já participei de uma comunidade no antigo Orkut onde só existiam múcios e haviam múcias também.
Porém essa estrada é de pedra e poeira. Não foi fácil chegar até aqui.
Desde a mais tenra idade já comecei a perceber que alguns problemas me acompanhariam vida a fora. Brincadeiras,  gozações, troca de letras e a necessidade de ficar repetindo o tempo todo e até soletrando para que as pessoas pudessem entender.
E como me chamam? Como eles me chamam? Ah tenho vários nomes. Eu sou o murso, o musgo,  Hugo, Hudson, Núcio, mussum (talvez seja atrapalhado)  mussarela, “mursarela”, “murcego”, “massum”, músculo, musculoso (estou longe disso), musgo, mugo ETC, ETC, e ETC  e o mais comum  Lúcio. A esse último adotei como meu apelido oficial.
Já perdi a conta de quantas vezes tive que soletrar  ou então dizer: é igual Lúcio só que com M no inicio.
Quando estou desanimado, e em lugares em que não preciso apresentar documento eu digo logo Lúcio (o apelido adotado) e se descobrirem a tramoia digo que entenderam errado. Outras vezes  falo diretamente o segundo nome Ataide porque  esse não traz tanta dúvida.
Uma vez numa festa ouvi meu nome ser pronunciado e fiquei curioso com o que diziam. O que eu não sabia era que estava sendo servida na recepção aquela sobremesa feita de limão ou maracujá, e por questões fonéticas a confusão se deu quando ouvi uma pessoa perguntando à outra: - Você comeu musse? – Não. -  Então coma. E outras conversas relacionadas... Musse é uma delícia... adoro musse... musse tá muito gostoso... musse com sabor de limão...  Demorei a perceber do que se tratava. Foi muito confusa essa situação.
Já me perguntaram se eu sou  descendente de árabes, porque dito rapidamente os dois nomes formam a palavra Mustaíd
Alguns produtos têm nomes parecidos ao meu.  Temos o  inocente leite mucil, o empolado cereal mucilon, e o tendencioso e imperativo  medicamento metamucil. Isso arrepia-me.
Certa vez quis mudar oficialmente para Lúcio, mas essa mudança é muito complicada porque precisa de um processo, a concessão judicial, toda uma   burocracia para se alterar  em todos os documentos e cadastros que tenho por aí... E fiquei com medo de me arrepender. Então desanimei.
Um dia uma pessoa me perguntou: Múcio como é seu nome de verdade? Eu falei  é Múcio mesmo. Ela disse: -Você está brincando, está fazendo hora com a minha cara, isso não é nome só pode ser apelido.
Teve alguém que começou a rir sem parar dizendo: Hahaha que nome mais engraçado!
Outros não conseguem decorar por mais que eu repita. E acho estranho porque a diferença está apenas em uma letra.
Quando eu mesmo preencho alguma ficha ou cadastro, observo a pessoa aproximando a ficha dos olhos para ler bem de  perto e ter a certeza de que é aquilo mesmo. E conferindo lá no chamegão. E observo até um risinho disfarçado.
Pelo telefone então é o caos. Vira uma batalha faraônica tentar fazê-los entender. Parece que as pessoas não aceitam que seja um pouco diferente e querem ter a certeza de que não podem tornar o nome comum. Insistem em muda-lo e adequá-lo  ao que já estão acostumados
Numa bela tarde tentava reservar uma diária de um hotel e então a odisseia começou:
-Alô
-Boa tarde. Eu gostaria de reservar um apartamento individual, uma diária para o próximo sábado, por favor.
- Sim, temos apenas o standard, os outros já estão reservados.
-Pode ser.
-E qual é o nome?
-Múcio Ataide Ferreira
-Como é que é ?
-Múcio
-Lúcio?
-Não, Múcio.
-Não entendi. Pode repetir por favor?
“Arc”!   - É Múcio
-Nossa é um nome diferente!
-É sim...
-Repete mais uma vez.
-Múcio.
-Ah  está certo  Sr.  agora entendi  vou soletrar:   M   U  C   H  O  ?
-Cancele a reserva por favor.

É desse jeito.  E vamos pela vida a fora.

Apesar de tudo gosto do meu nome. Ele me dá histórias para contar. 

 Neste site,  um pouco da carreira literária de Múcio Ataide, seguindo o caminho das letras para  brindar a vida e descobrir seus encantos e...